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A Comissão de Reexame é um órgão do Banco Central Europeu (BCE) que procede a revisões administrativas das decisões de supervisão da instituição. Uma revisão administrativa pode ser solicitada por qualquer pessoa singular ou coletiva diretamente afetada por uma decisão de supervisão do BCE. Os membros da Comissão de Reexame são especialistas externos e independentes, nomeados por um mandato de cinco anos, renovável apenas uma vez. O presente documento descreve os procedimentos e processos de revisão da Comissão de Reexame e os principais problemas e aspetos com que esta lidou na sua primeira década de existência (de setembro de 2014 a setembro de 2024).

1 Procedimentos e processos de revisão da Comissão de Reexame

Os procedimentos e processos de revisão da Comissão de Reexame regem‑se pelo Regulamento do Mecanismo Único Europeu (MUS) (o principal ato legislativo relativo à função do BCE de supervisão prudencial) e pela Decisão relativa à Comissão de Reexame (o ato jurídico do BCE que institui este órgão). Ambos os atos jurídicos especificam que os membros efetivos e os dois suplentes da Comissão de Reexame têm de agir com independência e no interesse público. A Comissão de Reexame tem de emitir um parecer no prazo de dois meses a contar da receção de um pedido de revisão considerado completo, a menos que o pedido seja considerado manifestamente inadmissível[1]. As revisões que efetua centram‑se na conformidade processual e substantiva das decisões contestadas com o Regulamento do MUS. Tendo em consideração o parecer da Comissão de Reexame, o Conselho de Supervisão do BCE apresenta uma nova decisão ao Conselho do BCE. A nova decisão pode anular a decisão contestada ou substituí‑la por uma decisão alterada ou por uma decisão de conteúdo idêntico à decisão contestada.

1.1 Quem pode contestar uma decisão perante a Comissão de Reexame?

A Comissão de Reexame tem lidado com pedidos de revisão apresentados por instituições de crédito e outras entidades ou pessoas singulares, tais como acionistas, administradores ou potenciais adquirentes de participação qualificada numa instituição de crédito. A jurisprudência da Comissão de Reexame e dos tribunais da União Europeia (UE) estabeleceu que a anterior administração de uma instituição pode solicitar a revisão de uma revogação da autorização como instituição de crédito[2], não sendo, porém, admissível que acionistas apresentem tal pedido.

1.2 Confidencialidade dos procedimentos e processos de revisão da Comissão de Reexame

Os procedimentos e processos de revisão da Comissão de Reexame são confidenciais, em conformidade com o artigo 22.º, n.º 2, da Decisão relativa à Comissão de Reexame.

Embora a Comissão de Reexame não torne públicos os seus pareceres, elementos da sua argumentação poderão ser divulgados ao público em contencioso perante os tribunais da UE. Os processos de revisão administrativa da Comissão de Reexame e algumas partes dos pareceres da mesma podem ser tornados públicos, caso o Tribunal de Justiça se refira aos mesmos em subsequentes processos judiciais. O Tribunal de Justiça poderá ter em conta o parecer da Comissão de Reexame ao decidir o litígio.

Os requerentes devem estar cientes de que qualquer segunda decisão – uma decisão posterior à revisão da Comissão de Reexame – adotada pelo BCE substitui a primeira decisão e, em geral, todos os processos judiciais intentados contra a decisão inicial poderão ser considerados inadmissíveis[3]. Um requerente que conteste a decisão posterior à revisão da Comissão de Reexame deve apresentar ao Tribunal de Justiça um pedido de reapreciação da segunda decisão, a decisão posterior à revisão da Comissão de Reexame. Dependendo das circunstâncias específicas do caso, um requerente poderá também ter interesse em contestar a decisão inicial.

A secção 2.11 fornece uma visão geral dos processos intentados junto do Tribunal de Justiça que mencionam uma revisão pela Comissão de Reexame.

1.3 Como é conduzida a revisão da Comissão de Reexame?

A revisão da Comissão de Reexame é realizada com base num pedido apresentado por qualquer pessoa singular ou coletiva diretamente afetada por uma decisão de supervisão do BCE. Esse pedido – o designado “pedido de revisão” – tem de indicar as razões invocadas pelo requerente que fundamentam a asserção de não conformidade processual e/ou substantiva da decisão do BCE contestada com o Regulamento do MUS.

Em princípio, não é apresentada uma correspondente contra‑argumentação escrita pelo BCE. Todavia, na revisão da decisão contestada, a Comissão de Reexame pode analisar o quadro de observações anexo ao ato contestado – esse quadro apresenta as observações do destinatário da decisão na fase de audição e a forma como o BCE as avaliou[4] – para determinar o que já foi discutido no procedimento administrativo. A Comissão de Reexame pode examinar o modo como o BCE avaliou e respondeu às observações formuladas pelo requerente na fase de audição que antecedeu a adoção da decisão contestada. Tal baseia‑se no âmbito alargado da revisão da Comissão de Reexame, que lhe permite analisar os fundamentos invocados pelo requerente, conforme constem do pedido de revisão, e eventuais incumprimentos de formalidades essenciais[5].

Em muitos casos, a Comissão de Reexame considerou ser necessária uma audição oral para avaliar de forma justa o pedido de revisão. Na audição oral, tanto o requerente como o BCE podem apresentar os seus argumentos e a Comissão de Reexame pode fazer perguntas. A audição oral proporciona outra oportunidade para o requerente e o BCE apresentarem as suas posições.

Tendo devidamente em consideração os elementos que lhe são apresentados, a Comissão de Reexame conclui a sua revisão com um parecer e propõe ao Conselho de Supervisão uma linha de ação, que o mesmo tem de considerar, mas pode, ou não, seguir[6].

1.4 Reconhecimento do papel da Comissão de Reexame

O processo L‑Bank foi o primeiro caso[7] de litígio judicial após revisão pela Comissão de Reexame. O Tribunal Geral e, em sede de recurso, o Tribunal de Justiça tiveram em conta o parecer da Comissão de Reexame ao avaliarem se a fundamentação da decisão do BCE posterior à revisão da Comissão de Reexame era adequada. Os tribunais da UE estabeleceram que, ao ser conforme com a proposta constante do parecer da Comissão de Reexame, a decisão do BCE contestada é uma extensão desse parecer, podendo as explicações aí contidas ser tomadas em consideração para determinar se a decisão contestada está suficientemente fundamentada. No processo L‑Bank, reconheceu‑se claramente o papel da Comissão de Reexame, o que foi depois reiterado noutros acórdãos. Um exemplo é o acórdão de 2017 do Tribunal Geral relativo ao processo Arkéa[8], que foi emitido após outro parecer da Comissão de Reexame e confirmado pelo Tribunal de Justiça em 2019.

2 Questões consideradas pela Comissão de Reexame

Desde a sua criação em 2014, a Comissão de Reexame analisou numerosas decisões do BCE, tendo examinado uma variedade de questões. Entre essas questões, são de salientar as seguintes: caráter significativo das instituições de crédito no âmbito do MUS; perímetro da supervisão em base consolidada; infrações de regras prudenciais (por exemplo, dos limites aos grandes riscos); regras de governo societário; poder de adotar medidas de supervisão com base em legislação nacional; cumprimento de requisitos prudenciais; revogação da autorização como instituição de crédito; sanções administrativas (nomeadamente a anonimização de uma sanção do BCE); medidas administrativas prescritas pelo direito nacional (juros de recuperação); aquisição de participações qualificadas; utilização de modelos internos para cálculo do capital regulamentar[9]; e inspeções no local. Em resultado, a Comissão de Reexame teve a oportunidade de estabelecer a sua própria jurisprudência, sendo elementos desta apresentados a seguir.

2.1 Fundamentação das medidas de supervisão

Um elemento recorrente nos pareceres da Comissão de Reexame tem sido a necessidade de o BCE fundamentar adequadamente as suas decisões de uma forma compreensível para a parte que contesta. A Comissão de Reexame incluiu uma declaração geral nos seus pareceres sobre a necessidade de a fundamentação ser mais aprofundada, quanto mais incisiva for a decisão adotada:

“As medidas discricionárias tomadas pelo BCE devem ser coerentes e proporcionadas. Quanto mais intrusivas forem as medidas, mais elevado deverá ser o grau de fundamentação.”[10]

A Comissão de Reexame insistiu que uma decisão do BCE deve respeitar o modelo de negócio e as especificidades da instituição de crédito e indicou que, para as decisões de supervisão serem eficazes e consideradas legítimas, é necessário fornecer fundamentação adequada. Essa fundamentação é ainda mais importante em medidas de supervisão de natureza intrusiva e deve ir além da mera invocação da lei e explicar a necessidade prudencial de adotar a decisão.

2.2 Conformidade da medida com o princípio da proporcionalidade

O papel primordial que o princípio da proporcionalidade desempenhou nos pareceres da Comissão de Reexame está estreitamente relacionado com o ponto anterior, dado que este princípio deve orientar todas as medidas das instituições da UE. A proporcionalidade surgiu como uma questão em muitos processos de revisão. Num parecer inicial, a Comissão de Reexame solicitou ao BCE que apresentasse uma argumentação alargada da proporcionalidade da sua decisão e que abordasse especificamente o impacto que o requerente alegava que a decisão teria.

A avaliação da proporcionalidade das medidas do BCE, realizada pela Comissão de Reexame quando a proporcionalidade é questionada pelos requerentes, é particularmente difícil quando o BCE dispõe de poderes discricionários. A Comissão de Reexame considerou que o BCE deve avaliar e explicar a proporcionalidade das suas medidas, quando exerce os seus poderes discricionários. O princípio da proporcionalidade também foi considerado em relação aos prazos de cumprimento de uma ordem ou de um pedido do BCE.

Num caso específico, em que a legislação nacional estabelecia um montante fixo a cobrar às instituições de crédito em caso de infração dos limites aos grandes riscos, a Comissão de Reexame concluiu que, ao aplicar a legislação nacional, o BCE não podia simplesmente basear‑se nesses montantes fixos, devendo explicar como aplicou o princípio da proporcionalidade. O Tribunal Geral teve devidamente em conta o parecer da Comissão de Reexame e concluiu que, ao adotar uma decisão por considerar que a imposição de juros de recuperação tinha caráter automático, o BCE baseou‑se numa premissa juridicamente errada. Tal viciou a análise do BCE do caráter proporcional da aplicação da lei nacional relevante, dado que o levou a não analisar as circunstâncias do caso[11]. O Tribunal Geral anulou a decisão do BCE.

2.3 Interpretação do conjunto único de regras

A questão da interpretação de termos do conjunto único de regras europeu (Single Rulebook) está estreitamente relacionada com o requisito de fundamentação. A Comissão de Reexame indicou “falta de fundamentação” para sublinhar que uma decisão do BCE se baseava numa interpretação sem explicar por que razão a mesma tinha sido selecionada e aplicada, sobretudo quando se afastava das orientações oficiais das autoridades de regulamentação. São exemplos a análise da Comissão de Reexame da interpretação do BCE de “controlo conjunto” no contexto do artigo 22.º da Diretiva 2013/34/UE relativa às demonstrações financeiras anuais (em casos de influência dominante ou controlo); de “consolidação proporcionada” nos termos do artigo 26.º da mesma diretiva, no caso de empreendimentos comuns; e do critério da “integridade” enunciado nas Orientações Conjuntas relativas à avaliação prudencial das aquisições e dos aumentos de participações qualificadas em entidades do setor financeiro[12] adotadas pelas Autoridades Europeias de Supervisão.

A Comissão de Reexame tem sido muitas vezes confrontada com as orientações da Autoridade Bancária Europeia (European Banking Authority – EBA), nomeadamente sobre os requisitos de adequação dos membros do órgão de administração de uma instituição de crédito (EBA/GL/2012/06), o SREP (EBA/GL/2014/13) e a classificação de instituições como “outras instituições de importância sistémica” (EBA/GL/2014/10). As Orientações Conjuntas relativas à avaliação prudencial das aquisições e dos aumentos de participações qualificadas em entidades do setor financeiro (JC/GL/2016/01) também figuraram nas deliberações da Comissão de Reexame. As Orientações da EBA relativas à estimação de probabilidade de incumprimento, à estimação da perda dado o incumprimento e ao tratamento das posições em risco em situação de incumprimento (EBA/GL/2017/16) desempenharam um papel em algumas avaliações da Comissão de Reexame. Por último, foram igualmente invocadas as orientações da EBA adotadas nos termos do artigo 396.º, n.º 3, do regulamento em matéria de requisitos de fundos próprios (Capital Requirements Regulation – CRR) (EBA/GL/2021/09). Como todas as autoridades competentes, o BCE tem de cumprir as orientações emitidas por uma autoridade de regulamentação da UE e de justificar qualquer afastamento das mesmas.

2.4 Legislação nacional insuficientemente harmonizada

As diferenças nas regras de supervisão nacionais foram um desafio para o BCE e a Comissão de Reexame. Tal foi especificamente mencionado no Relatório Anual do BCE sobre as atividades de supervisão de 2015[13] e repetido no de 2016[14]. O estatuto de “legislação” nacional é, por vezes, também uma questão de diferentes perspetivas, por exemplo, quando está em causa uma circular ou outro método de comunicação menos formal da autoridade nacional.

2.5 Direitos de defesa em caso de revogação da autorização como instituição de crédito: legitimidade da ação dos acionistas e do conselho de administração

Tal como já referido, o Tribunal de Justiça decidiu que os acionistas de uma instituição de crédito não podem agir para defender os interesses da mesma (e indiretamente os seus próprios interesses) solicitando uma revisão. Esta questão surgiu em casos em que a entidade em causa estava já em processo de liquidação ou em que o seu órgão de administração tinha sido dissolvido em resultado da liquidação ou da nomeação de um administrador especial.

A revogação da autorização como instituição de crédito da Trasta levou a uma revisão pela Comissão de Reexame e a subsequentes processos judiciais, instaurados por acionistas contra o BCE e a Comissão Europeia. Anulando um julgamento anterior de admissibilidade da ação dos acionistas emitido pelo Tribunal Geral, o Tribunal de Justiça[15] pronunciou‑se em favor da abordagem inicial da Comissão de Reexame[16] de aceitar o procurador inicialmente mandatado para contestação em nome da instituição e rejeitou a admissibilidade dos acionistas da mesma na contestação da revogação da autorização como instituição de crédito[17]. Ao mesmo tempo, num processo diferente não precedido de uma revisão pela Comissão de Reexame, o Tribunal de Justiça sublinhou que os poderes de representação residual do anterior conselho de administração poderão não persistir em todos os casos. Nesse caso específico, foi designada uma pessoa competente para representar a instituição de crédito e não existia qualquer conflito de interesses comprovado que impedisse essa pessoa de representar a instituição. Por conseguinte, o tribunal não reconheceu o antigo conselho de administração como representante da instituição[18].

No processo Nemea, a Comissão de Reexame recebeu um pedido de revisão apresentado conjuntamente pelos administradores da instituição de crédito e pelos acionistas[19].

Noutro processo, também relativo à revogação da autorização como instituição de crédito e a uma revisão da Comissão de Reexame, o Tribunal Geral confirmou a falta de legitimidade dos acionistas de recorrer de uma decisão do BCE[20]. Esta abordagem é coerente com as conclusões relativas à falta de legitimidade dos acionistas para contestar as decisões de não resolução do Conselho Único de Resolução nos processos ABLV[21].

2.6 Novos desenvolvimentos e novos factos

Uma questão particularmente difícil prendeu‑se com novos desenvolvimentos após a emissão da decisão contestada ou o surgimento de novos factos durante o processo de revisão. Embora uma revisão administrativa tenha de avaliar a conformidade do ato jurídico com o quadro jurídico no momento da adoção do ato contestado, a Comissão de Reexame não se abstraiu de novos factos apurados durante a fase de audição e não ignorou alterações relevantes da situação do requerente. Quando ocorreu uma alteração relevante “na vida real”, a Comissão de Reexame reconheceu esse desenvolvimento e propôs ao Conselho de Supervisão que tivesse em conta a alteração.

Ao receber o parecer da Comissão de Reexame, o Conselho de Supervisão reexamina o caso e é competente para ter em conta todas as considerações pertinentes, tal como confirmado pelo Tribunal Geral no processo Versobank[22].

2.7 Direito de audição

A Comissão de Reexame estabeleceu que, a fim de assegurar o direito efetivo a ser ouvido (direito de audição), o âmbito completo de uma medida de supervisão contemplada deve ser discutido com o requerente num prazo razoável antes de essa decisão ser finalizada. Na sequência da alteração, em 2023, da Decisão relativa à Comissão de Reexame, foi agora explicitamente confirmado que a Comissão de Reexame pode rever se o direito de audição foi respeitado no procedimento administrativo, mesmo quando o requerente não apresente esse fundamento[23].

2.8 Igualdade de condições

Em alguns processos de revisão, a Comissão de Reexame foi confrontada com argumentos de que uma decisão do BCE não respeitava a igualdade de condições, por afetar negativamente o requerente no mercado bancário. A Comissão de Reexame avaliou tais alegações com base no princípio da igualdade e no contexto do papel da Supervisão Bancária do BCE na promoção de normas prudenciais coerentes em toda a área do euro. Nesses casos, a Comissão de Reexame sublinhou que, para assegurar a igualdade de condições, o BCE deve utilizar os seus poderes prudenciais de forma coerente em todos os Estados‑Membros participantes, em conformidade com todos os princípios gerais estabelecidos no quadro jurídico da UE.

2.9 Suspensão da decisão contestada

A Comissão de Reexame estabeleceu que uma situação extraordinária, como a pandemia de coronavírus (COVID‑19), poderia – ponderando os interesses em causa – justificar a suspensão da aplicação de uma decisão de supervisão do BCE.

2.10 Sanções

A Comissão de Reexame examinou vários pedidos de revisão de decisões do BCE a impor sanções administrativas pecuniárias. Em especial, os requerentes contestaram a proporcionalidade das sanções impostas e se o BCE tinha tomado em consideração todas as circunstâncias pertinentes. Num caso específico, a Comissão de Reexame considerou que o princípio da proporcionalidade tem de ser tido em conta na aplicação dos vários elementos da metodologia do BCE para imposição de sanções administrativas, incluindo na determinação do grau de má conduta e de gravidade da infração em causa. Tal levou a Comissão de Reexame a propor ao BCE que alterasse a decisão inicial.

Relativamente à publicação de sanções, a Comissão de Reexame considerou que uma sanção anonimizada só se justifica quando a publicação dessa sanção pode ter consequências negativas significativas para o requerente. Constatou‑se que a publicação sob forma anonimizada só era permitida em casos específicos. A publicação de uma decisão sancionatória não era uma penalização em si, nem um elemento acessório da sanção, mas um requisito imposto pelo legislador, com vista a assegurar o efeito dissuasivo geral de tal medida através da informação do público. A Comissão de Reexame considerou que avaliar se a publicação causaria, ou não, danos desproporcionados ao requerente[24] se limitaria a determinar as possíveis consequências da publicação. A avaliação não revia elementos anteriormente ponderados para determinar a proporcionalidade de uma sanção. Por último, a Comissão de Reexame considerou que a proporcionalidade da decisão de publicar a sanção seria assegurada pela avaliação das exceções em que é necessária anonimização, previstas pelo legislador no artigo  8.º, n.º 2, da diretiva relativa aos requisitos de fundos próprios (Capital Requirements Directive – CRD) e no artigo 132.º, n.º 1, do Regulamento‑Quadro do MUS. O Tribunal Geral pronunciou‑se igualmente nesse sentido[25].

2.11 Apresentação geral das revisões da Comissão de Reexame do domínio público

Segue‑se uma apresentação geral dos processos da Comissão de Reexame que foram submetidos aos tribunais da UE para reapreciação. Estes processos incidiram sobre diversos aspetos, em particular a revogação da autorização como instituição de crédito, juntamente com a questão preliminar da legitimidade de ação dos acionistas nos processos Trasta (processos T‑247/16 e T‑698/16), Niemelä e o./BCE (processo T‑321/17) e Ukrselhosprom PCF e Versobank/BCE (processos T‑351/18 e T‑584/18). São de mencionar também os acórdãos do processo L‑Bank (processo C‑450/17 P), sobre o caráter significativo, e do processo Arkéa (processos C‑152/18 P e C‑153/18 P), sobre uma decisão SREP, bem como sobre a determinação de amplos poderes para o BCE ao abrigo do artigo 16.º do Regulamento do MUS (processos T‑150/18 e T‑345/18). Os processos Crédit Agricole (processos T‑133/16 a T‑136/16) prenderam‑se com a acumulação de funções executivas e não executivas, tendo o Tribunal Geral chegado às mesmas conclusões que a Comissão de Reexame, apesar de ter seguido uma linha de raciocínio distinta, como patente no sumário. A imposição de sanções foi objeto de recurso junto do tribunal em VQ/BCE (processo T‑203/18) e a informação publicamente disponível sobre a multa demonstra que o processo diz respeito ao Banco Sabadell, relativamente ao qual a Comissão de Reexame emitiu um parecer[26]. Os processos Sberbank (processos T‑647/21 e T‑99/22) prendem‑se com as regras que regem a imposição pelo BCE de juros de recuperação – uma medida administrativa não harmonizada na aceção do artigo 65.º, n.º 1, da CRD.

A Comissão de Reexame emitiu um parecer em vários processos em que o recurso interposto não menciona a revisão administrativa prévia, ou em que o processo judicial continua em curso e a decisão judicial ainda está pendente. Por conseguinte, estas revisões da Comissão de Reexame ainda não são do domínio público.

Quadro 1

Revisões da Comissão de Reexame do domínio público

Número do processo

Objeto

1

L‑Bank (processos T‑122/15 e C‑450/17 P)

Caráter significativo das instituições de crédito

2

Arkéa (processos T‑712/15, T‑52/16, C‑152/18 P e C‑153/18 P)

SREP

3

Crédit Agricole (processos T‑133/16, T‑134/16 e T‑135/16)

Acumulação de funções executivas e não executivas

4

Trasta (processos T‑247/16, T‑698/16 e C‑663/17 P, C‑665/17 P e C‑669/17 P)

Revogação da autorização como instituição de crédito

5

Niemelä e o. (processo T‑321/17)

Revogação da autorização como instituição de crédito

6

BNP Paribas (processos T‑150/18 e T‑345/18)

SREP

7

Ukrselhosprom PCF e Versobank (processos T‑351/18 e T‑584/18)

Revogação da autorização como instituição de crédito

8

VQ (processo T‑203/18)

Sanções

9

Sberbank (processos T‑647/21 e T‑99/22 P)

Medidas administrativas

10

HKB (processo T‑323/22)

Aquisição de participações qualificadas

Além dos vereditos dos tribunais da UE, a Comissão de Reexame informou sobre os seguintes temas gerais como objeto de pedidos de revisão:

  • caráter significativo (Relatório Anual do BCE sobre as atividades de supervisão de 2014);
  • governo societário;
  • cumprimento dos requisitos prudenciais;
  • revogação da autorização como instituição de crédito (Relatório Anual do BCE sobre as atividades de supervisão de 2016, 2017, 2018 e 2019);
  • sanções administrativas, incluindo a anonimização de decisões do BCE (Relatório Anual do BCE sobre as atividades de supervisão de 2017 e 2019);
  • aquisição de participações qualificadas (Relatório Anual do BCE sobre as atividades de supervisão de 2018 e 2019);
  • modelos internos (Relatório Anual do BCE sobre as atividades de supervisão de 2019 e 2020);
  • inspeções no local (Relatório Anual do BCE sobre as atividades de supervisão de 2020);
  • poder para adotar medidas de supervisão com base em legislação nacional (Relatório Anual do BCE sobre as atividades de supervisão de 2021).

Quadro 2

Número de revisões efetuadas pela Comissão de Reexame

Total*

2024*

2023

2022

2021

2020

2019

2018

2017

2016

2015

2014

Pareceres da Comissão de Reexame finalizados

36

3

2

1

2

5**

4

4

6

6

3

Pareceres da Comissão de Reexame que propuseram substituir a decisão contestada por uma decisão de conteúdo idêntico

17

3***

1

1

3

4

1

2

2

Pareceres da Comissão de Reexame que propuseram substituir a decisão contestada por uma decisão alterada ou com uma melhor fundamentação

10

1

1

1

2

4

1

Pareceres da Comissão de Reexame que propuseram revogar a decisão contestada e substituí‑la por uma nova decisão

1

1

Pareceres da Comissão de Reexame que propuseram revogar a decisão contestada

1

1

Pareceres da Comissão de Reexame que declararam o pedido improcedente

7

1

1

2

3

Pedidos retirados

7

1

1

1

1

2

1

Propostas de suspensão pela Comissão de Reexame

1

1

Fonte: BCE.
* A data de fecho da informação é 31 de agosto de 2024.
** Um parecer abrangeu duas decisões do BCE.
*** Num dos três pareceres, a Comissão de Reexame propôs que o Conselho de Supervisão substituísse a decisão contestada por uma decisão que estabelece as mesmas medidas de supervisão.

© Banco Central Europeu, 2024

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A data de fecho da informação incluída neste relatório foi 31 de agosto de 2024.

Para uma definição da terminologia específica, consultar o glossário do MUS.


HTML ISBN 978‑92‑899‑6805‑8 doi:10.2866/828919 QB‑09‑24‑609‑PT‑Q


  1. O artigo 11.º, n.º 2, da Decisão relativa à Comissão de Reexame estabelece que, se a Comissão de Reexame considerar o pedido de revisão manifestamente não admissível, poderá declará‑lo inadmissível no prazo de dez dias úteis a contar da receção do pedido de revisão completo. Se o pedido de revisão for declarado inadmissível, de acordo com o disposto no referido artigo 11.º, n.º 2, não será adotado um parecer sobre a revisão.

  2. Ver acórdão de 5 de novembro de 2019, BCE/Trasta Komercbanka e o., processos apensos C‑663/17 P, C‑665/17 P e C‑669/17 P (ECLI:EU:C:2019:923). No entanto, dependendo das circunstâncias específicas, a anterior administração poderá não representar a instituição na contestação da revogação da autorização como instituição de crédito, tal como determinado no acórdão de 8 de fevereiro de 2024, Pilatus Bank e o./BCE e o., processo C‑256/22 P (ECLI:EU:C:2024:125).

  3. Tal decorre do acórdão de 6 de outubro de 2021, Ukrselhosprom PCF e Versobank/BCE, processos apensos T‑351/18 e T‑584/18 (ECLI:EU:T:2021:669); do acórdão de 7 de setembro de 2023, Versobank AS e Ukrselhosprom PCF/BCE e o., processo C‑803/21 P (ECLI:EU:C:2023:630); do despacho de 17 de novembro de 2021, Fursin e o./BCE, processo T‑247/16 RENV; e do despacho de 20 de dezembro de 2021, Niemelä e o./BCE, processo T‑321/17 (ECLI:EU:T:2021:942). Contudo, importa sublinhar que o parecer da advogada‑geral J. Kokott no recurso pendente do acórdão no processo T‑321/17 (ECLI:EU:C:2023:935) concluiu que o interesse de um requerente em obter a eliminação dos efeitos jurídicos adversos imediatos da decisão inicial, em conseguir que o BCE tome as medidas necessárias para dar cumprimento a um acórdão que anula essa decisão – nos termos do artigo 266.º, n.º 1, do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia – e em utilizar esse acórdão como base para intentar uma ação de indemnização subsistia mesmo que essa decisão inicial tivesse sido substituída por uma segunda decisão posterior à revisão da Comissão de Reexame.

  4. Sobre o direito de audição, ver também o artigo 22.º do Regulamento do MUS.

  5. Ver o artigo 10.º, n.º 2, da Decisão relativa à Comissão de Reexame.

  6. “O Conselho de Supervisão tem em conta o parecer da Comissão de Reexame” (artigo 24.º, n.º 7, do Regulamento do MUS); “[a] avaliação do Conselho de Supervisão não fica limitada ao exame dos fundamentos apresentados pelo requerente no pedido de revisão, [podendo] este considerar igualmente outros elementos na sua proposta de novo projeto de decisão” (artigo 17.º, n.º 1, da Decisão relativa à Comissão de Reexame).

  7. As decisões do tribunal deram razão ao BCE. Ainda mais relevante é o reconhecimento, pelo tribunal, do caráter exclusivo dos poderes prudenciais do BCE: acórdão de 16 de maio de 2017, Landeskreditbank Baden‑Württemberg/ECB, processo T‑122/15 (ECLI:EU:T:2017:337). Este acórdão foi confirmado em sede de recurso pelo Tribunal de Justiça no acórdão de 8 de maio de 2019, Landeskreditbank Baden Württemberg/BCE, processo C‑450/17 P (ECLI:EU:C:2019:372). Além disso, no seu acórdão de 30 de julho de 2019 (2 BvR 1685/14, 2 BvR 2631/14), o Tribunal Constitucional Federal alemão forneceu uma interpretação do acórdão do Tribunal de Justiça no processo L‑Bank.

  8. Ver o acórdão de 13 de dezembro de 2017, Crédit mutuel Arkéa/BCE, processo T‑712/15 (ECLI:EU:T:2017:900); acórdão de 13 de dezembro de 2017, Crédit mutuel Arkéa/BCE, processo T‑52/16 (ECLI:EU:T:2017:902); e acórdão de 2 de outubro de 2019, Crédit Mutuel Arkéa/BCE, processos apensos C‑152/18 P e C‑153/18 P (ECLI:EU:C:2019:810). O acórdão do processo Arkéa refere‑se a uma decisão no âmbito do processo de análise e avaliação para fins de supervisão (supervisory review and evaluation process – SREP) adotada relativamente ao grupo Crédit Mutuel, do qual a Arkéa faz parte – recentemente parte relutante, devido a uma disputa com o órgão central deste grupo de cooperativas de crédito francesas (a Confédération Nationale du Crédit Mutuel – CNCM) e com outro grupo de cooperativas de crédito mútuo (o grupo CM11‑CIC). Ver o sumário dos acórdãos.

  9. No contexto do relatório do BCE sobre o projeto de análise específica dos modelos internos (targeted review of internal models – TRIM).

  10. A abordagem da Comissão de Reexame no que respeita à fundamentação foi divulgada no Relatório Anual do BCE sobre as atividades de supervisão de 2017: “Nomeadamente, segundo a Comissão de Reexame, quanto mais intrusivas são as medidas impostas, maior é o nível de fundamentação exigido.”

  11. Acórdão de 28 de fevereiro de 2024, SBER Vermögensverwaltungs AG/BCE e o., processos apensos T‑647/21 e T‑99/22 (ECLI:EU:T:2024:127), n.os 44 a 81.

  12. Orientações Conjuntas relativas à avaliação prudencial das aquisições e dos aumentos de participações qualificadas em entidades do setor financeiro (JC/GL/2016/01), 20 de dezembro de 2016.

  13. “A Comissão de Reexame detetou falta de harmonização na aplicação da legislação europeia a nível nacional em áreas como a consolidação bancária ou os requisitos de adequação e idoneidade. Na verificação dos pedidos de reexame, notou que, dado ser permitida uma considerável margem discricionária às instituições de crédito, as diferenças daí decorrentes dificultam o reexame das decisões do BCE de modo coerente.” No seu contributo conjunto – “The Administrative Board of Review of the European Central Bank: Experience After 2 Years”, European Business Organisation Law Review, setembro de 2017 – Concetta Brescia Morra, Andrea Magliari e René Smits afirmam igualmente que a diversidade do direito nacional também representa um grande desafio para a Comissão de Reexame.

  14. O Relatório Anual do BCE sobre as atividades de supervisão de 2016 destacava que “[o] reexame das decisões do BCE constituiu um desafio, devido, em particular, à fragmentação regulamentar (diferente transposição da legislação europeia para a esfera nacional) e à consequente ampla margem para discricionariedade a nível nacional.”

  15. Despacho de 12 de setembro de 2017, Trasta Komercbanka AS/BCE, processo T‑247/16 (ECLI:EU:T:2017:623), que rejeita a ação da Trasta Komercbanka como inadmissível e julga a ação dos acionistas como admissível.

  16. Ver as conclusões da advogada‑geral J. Kokott, de 11 de abril de 2019, nos processos apensos C‑663/17 P, C‑665/17 P e C‑669/17 P (ECLI:EU:C:2019:323), n.os 19 e 74.

  17. Acórdão de 5 de novembro de 2019, BCE/Trasta Komercbanka e o., processos apensos C‑663/17 P, C‑665/17 P e C‑669/17 P (ECLI:EU:C:2019:923).

  18. Acórdão de 8 de fevereiro de 2024, Pilatus Bank e o./BCE e o., processo C‑256/22 P (ECLI:EU:C:2024:125), n.os 34 a 73.

  19. Ver o despacho de 20 de dezembro de 2021, Niemelä e o./BCE, processo T‑321/17 (ECLI:EU:T:2021:942), recurso pendente (processo C‑181/22 P).

  20. Acórdão de 6 de outubro de 2021, Ukrselhosprom PCF e Versobank/BCE, processos apensos T‑351/18 e T‑584/18 (ECLI:EU:T:2021:669) e acórdão de 7 de setembro de 2023, Versobank AS e Ukrselhosprom PCF/BCE e o., processo C‑803/21 P (ECLI:EU:C:2023:630).

  21. Despacho de 14 de maio de 2020, Bernis e o./Conselho Único de Resolução (CUR), processo T‑282/18 (ECLI:EU:T:2020:209); acórdão de 24 de fevereiro de 2022, Bernis e o./CUR, processo C‑364/20 P (ECLI:EU:C:2022:115); e acórdão de 6 de julho de 2022, ABLV Bank/CUR, processo T‑280/18 (ECLI:EU:T:2022:429), recurso pendente (processo C‑602/22 P).

  22. Acórdão de 6 de outubro de 2021, Ukrselhosprom PCF e Versobank/BCE, processos apensos T‑351/18 e T‑584/18 (ECLI:EU:T:2021:669), n.º 79.

  23. Ver o artigo 10.º, n.º 2, da Decisão relativa à Comissão de Reexame.

  24. Danos desproporcionados para o requerente significa danos que vão além de um impacto negativo na reputação da entidade supervisionada e na sua posição no mercado, o que corresponde ao que a injunção legislativa de publicação aceita como consequência da publicação de uma sanção por violação de uma regra prudencial.

  25. Acórdão de 8 de julho de 2020, VQ/BCE, processo T‑203/18 (ECLI:EU:T:2020:313), n.os 69 a 99.

  26. Acórdão de 8 de julho de 2020, VQ/BCE, processo T‑203/18 (ECLI:EU:T:2020:313), n.os 7 e 8.

Participação de infrações