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União bancária em 2017 – Como supervisionar um setor bancário que ascende a 27 biliões de euros?

Discurso de Pentti Hakkarainen, Membro do Conselho de Supervisão do BCE, na Conferência Internacional Anual do Centro de Investigação sobre Regulação e Supervisão do Setor Financeiro (CIRSF), Lisboa, 1 de junho de 2017

Introdução

É um prazer estar aqui em Lisboa para participar nesta conferência. Foi com agrado que recebi o convite para falar sobre estes temas importantes, em especial quando tomei conhecimento da localização.

É particularmente oportuno debater os princípios da subsidiariedade e da proporcionalidade nesta data, que coincide com o 19.º aniversário da criação do Banco Central Europeu (BCE). De acordo com a minha experiência, o BCE procurou sempre respeitar, na tomada de decisões e nas suas operações, a ênfase colocada pelos Tratados da União Europeia (UE) nestes princípios.

Por conseguinte, gostaria de aproveitar esta oportunidade para abordar a forma como a Supervisão Bancária do BCE segue a mesma abordagem respeitadora no contexto das suas atribuições e proporcionar-lhes uma perspetiva de bastidores de como é supervisionado um dos maiores setores bancários do mundo. Espero que as minhas observações sirvam como ponto de partida útil para explorar algumas das questões importantes que figuram na ordem do dia.

Subsidiariedade como princípio subjacente à supervisão bancária europeia

Os cidadãos da área do euro necessitam de um setor bancário forte e dinâmico para poderem gerir as suas finanças pessoais e, evidentemente, as empresas precisam de condições idênticas para exercerem as suas atividades de negócio com eficiência. O reconhecimento desta necessidade e os benefícios concorrenciais de uma abordagem única à supervisão bancária levaram os líderes europeus, em 2012, a propor a criação de uma união bancária.

Desde que essa decisão foi tomada, observadores pouco atentos assumiram muitas vezes que a tomada de decisões no sistema bancário da área do euro foi totalmente centralizada no BCE. Explicarei hoje por que razão a realidade não é assim tão simples. Ao fazê-lo, espero dar uma perspetiva sobre a forma como a nossa estrutura e os processos de tomada de decisão obedecem ao princípio da subsidiariedade.

Como creio ser do conhecimento de todos, o princípio da subsidiariedade está consagrado nos Tratados da UE, o que significa que é aplicável a todas as atividades conduzidas a nível da UE, incluindo a supervisão bancária. Na essência, a ideia subjacente é a de que os organismos europeus apenas têm poderes para atuar onde uma perspetiva europeia proporcione a melhor plataforma para a tomada de decisões no interesse dos povos da Europa.

Este princípio protege o sistema da tendência dos decisores de política europeus para centralizar o poder e a tomada de decisões. Ajuda-nos a assegurar que as decisões são tomadas o mais próximo possível da esfera relevante. No entanto, também exige que tomemos decisões a um nível suficientemente elevado para permitir a devida consideração de todas as implicações das mesmas.

Antes de entrar em detalhes, gostaria de referir rapidamente três aspetos. Primeiro, o nosso trabalho de supervisão é realizado em estreita colaboração com os colegas das autoridades nacionais competentes. Segundo, embora o BCE seja o responsável último pela tomada de decisões no domínio da supervisão bancária, cada uma das autoridades nacionais competentes participa plenamente nas discussões do Conselho de Supervisão e vota cada decisão. Terceiro, importa destacar que a decisão, no mês passado, do Tribunal de Justiça da UE no processo do L-Bank veio substanciar fortemente a legalidade das nossas estruturas e a sua compatibilidade com a nossa obrigação jurídica de respeitar o princípio da subsidiariedade. Este banco alegou que nos tínhamos desviado dos nossos poderes ao designar o L-Bank como uma “instituição significativa” – que seria diretamente supervisionada pelo BCE. O Tribunal de Justiça da UE rejeitou esta interpretação e deixou claro que o BCE tem a autoridade para liderar a supervisão de todos os bancos da área do euro com ativos num montante igual ou superior a 30 mil milhões de euros[1].

Estes aspetos refletem o nosso compromisso no sentido de observar o princípio da subsidiariedade no trabalho da Supervisão Bancária do BCE.

Com efeito, analisando em retrospetiva a decisão de elevar para a esfera europeia a responsabilidade pela supervisão bancária, a subsidiariedade esteve sempre no âmago da nossa existência. São três as razões subjacentes.

Em primeiro lugar, o alcance de uma supervisão bancária puramente nacional era demasiado restrito. O frequentemente citado “trilema financeiro” de Dirk Schoenmaker ajuda-nos a conceptualizar este facto elementar. Segundo este trilema, a estabilidade financeira, a integração financeira e as políticas financeiras nacionais são incompatíveis – em qualquer momento, só é possível manter simultaneamente dois destes fatores.

Na Europa, vigora um sistema de passaporte único para que as instituições de crédito operem em todos os países da UE. Além disso, temos alguns bancos transnacionais de importância sistémica para múltiplos Estados-Membros. Por conseguinte, faz sentido que a tomada de decisões no tocante à supervisão destes bancos ocorra a nível supranacional.

Tal permite ter em conta os interesses de todos os países afetados quando são tomadas decisões de supervisão. De igual modo, esta perspetiva europeia proporciona à autoridade de supervisão uma visão alargada dos riscos que podem atingir todo o continente. A supervisão bancária europeia pode, assim, adotar medidas com celeridade para gerir de forma proativa os riscos transfronteiras e manter eficazmente a estabilidade financeira.

Em segundo lugar, argumentaria que a estrutura nacional da supervisão bancária existente na Europa tinha uma tendência para ser parcial no sentido de erigir “campeões nacionais” e apoiar modelos de negócio bancário locais.

Não pretendo dizer que essa parcialidade advinha de más intenções de autoridades de supervisão nacionais individuais. A verdade é que o modelo de supervisão nacional apresenta uma tendência estrutural para o laxismo, que está para além do controlo dos indivíduos. Mais especificamente, o foco restrito das autoridades de supervisão nacionais não contempla a transmissão do risco além-fronteiras. Tal, por seu lado, tende a resultar numa subestimação sistemática da dimensão dos riscos e, por conseguinte, numa supervisão excessivamente superficial.

Com a transferência das responsabilidades de supervisão para a esfera supranacional, passa a ser possível captar a transmissão do risco a nível transfronteiras. Além disso, como prestamos contas a nível europeu e temos obrigações perante todos os cidadãos da área do euro, não somos permeáveis à influência de parcialidades nacionais. Tal permite-nos adotar uma abordagem europeia harmonizada e rigorosa em relação à supervisão bancária e criar condições de igualdade para todas as instituições de crédito.

Em terceiro e último lugar, acredito que esta abordagem de supervisão harmonizada e rigorosa proporciona a base adequada para o estabelecimento de um setor bancário verdadeiramente integrado no conjunto da área do euro. As instituições de crédito sabem que receberão o mesmo tratamento onde quer que estejam localizadas. Beneficiam igualmente de ter uma única autoridade de supervisão, com os mesmos processos em todos os países. Importa ainda realçar que a Supervisão Bancária do BCE em Frankfurt dispõe de recursos consideráveis, em comparação com o anterior sistema de autoridades nacionais.

Estes fatores deverão ajudar a encorajar instituições de crédito eficientes e competitivas a estabelecer operações transfronteiras nos vários países europeus e, dessa forma, apoiar um mercado financeiramente integrado. Gostaria de acrescentar que consideramos positivo que instituições de crédito sólidas e eficientes alarguem a sua atividade a toda a Europa. No atual contexto, seria benéfico que se verificassem mais fusões transfronteiras.

A integração e concorrência financeiras potenciadas pela união bancária são claramente algo de bom para a Europa e, em particular, para o funcionamento da moeda. A união bancária oferecerá condições de igualdade a todas as instituições de crédito, independentemente de onde estejam localizadas, aumentando, assim, a concorrência no setor bancário.

A concorrência proporcionará maior escolha e serviços de melhor qualidade aos consumidores. Com o tempo, as melhores instituições de crédito expandirão as suas operações em escala e dimensão geográfica e poderão, então, oferecer empréstimos a particulares e empresas na economia real de forma eficiente e eficaz em termos de custos. Quando isso acontece num contexto de segurança e solidez do setor bancário, existem benefícios para todos, qualquer que seja a sua localização.

De igual modo, um mercado bancário alargado e integrado contribui para garantir uma afetação eficiente dos recursos – apoiando, dessa forma, o crescimento. Um mercado bancário único ajuda também a regularizar a transmissão monetária, ao impedir que surjam diferenças injustificadas em termos de custo do financiamento entre os países.

Papel importante das autoridades nacionais competentes na supervisão bancária europeia

Tendo referido que a transferência das responsabilidades de supervisão bancária para a esfera europeia é consentânea com o princípio da subsidiariedade, explicarei agora como distribuímos essas responsabilidades no sistema. Espero demonstrar que a afetação de responsabilidades entre a autoridade central e as autoridades nacionais é apropriada. Dependendo da situação, o BCE ou delega ou lidera as decisões, tendo as autoridades nacionais e o BCE de colaborar em todas as ocasiões para alcançar os melhores resultados.

Como expliquei antes, o BCE está no cerne da supervisão bancária europeia. A decisão, no mês passado, do Tribunal de Justiça da UE no processo do L-Bank veio confirmar o estatuto do BCE neste domínio, deixando claro que o BCE tem competência exclusiva em questões de supervisão bancária no conjunto da união bancária. Em termos práticos, numa base diária, tal significa que o BCE é responsável pela supervisão direta das instituições de crédito de maior dimensão, mais sistémicas e mais ativas internacionalmente. Estas instituições significativas são as que têm as maiores implicações a nível transfronteiras, sendo, por conseguinte, as que mais justificam a adoção de uma abordagem supranacional.

O BCE recorre a equipas conjuntas de supervisão para supervisionar as instituições significativas. Essas equipas são compostas por técnicos locais das autoridades nacionais e por membros de pessoal do BCE, que trabalham em Frankfurt. São lideradas por um colaborador do BCE, que coordena e dirige os trabalhos. Tal permite ao BCE cumprir a sua responsabilidade de liderar a supervisão das instituições de crédito em causa, garantindo ao mesmo tempo que os conhecimentos especializados e a experiência a nível local fundamentais sejam mantidos e utilizados.

Além destas funções de supervisão direta, o BCE também lidera ao estabelecer o quadro de políticas horizontais para a execução da supervisão bancária europeia. Faz sentido que este trabalho seja realizado a nível central, atendendo ao objetivo de criar condições de igualdade em todo o sistema. Contudo, os conhecimentos especializados dos técnicos das autoridades nacionais são extremamente valiosos para o BCE na tomada de decisões sobre a conceção de políticas horizontais. Os contributos dos técnicos das autoridades nacionais são facilitados através de várias redes presididas pelo BCE, que foram estabelecidas para cada domínio de intervenção pertinente.

A supervisão quotidiana das instituições de crédito com ativos inferiores a 30 mil milhões de euros é, em geral, delegada nas autoridades nacionais competentes. Tal reflete o facto de estas instituições terem menor impacto nos diversos setores, dado que o potencial para exercerem um efeito considerável na economia real é limitado. Nessas circunstâncias, as autoridades de supervisão nacionais permanecem numa boa posição para continuar a assumir a liderança nestas questões.

O BCE proporciona uma liderança forte ao estabelecer o quadro de supervisão horizontal, tendo em vista a harmonização das abordagens em matéria de supervisão e o estabelecimento de condições equitativas em termos de concorrência para essas instituições de crédito de menor dimensão. Além disso, quando surgem preocupações de que as autoridades de supervisão nacionais não estão a controlar adequadamente os riscos nas instituições de crédito locais, o BCE tem o direito de intervir e assumir a liderança. Esta opção constitui um instrumento disciplinador, sendo útil para assegurar que continuam a existir os incentivos certos a nível local.

Como já referi, as autoridades nacionais competentes também participam ativamente na tomada de decisões no centro da supervisão bancária europeia. Cada uma das autoridades de supervisão nacionais está representada no Conselho de Supervisão e tem direito de voto em todas as decisões importantes por ele tomadas. Este papel das autoridades nacionais competentes reforça a capacidade de tomada de decisões da Supervisão Bancária do BCE, assegurando a adesão das autoridades nacionais no que respeita a decisões de supervisão difíceis e conferindo, assim, maior legitimidade ao sistema.

Importa, porém, deixar claro que não se pretende, de modo algum, que cada membro do Conselho de Supervisão se centre na defesa e na promoção dos respetivos interesses nacionais. Pelo contrário, a nossa participação é a título pessoal e não como representantes da autoridade do nosso país de origem.

Este facto vem no seguimento do forte exemplo dado por Hans Tietmeyer, antigo presidente do Bundesbank, nas reuniões iniciais do Conselho do BCE. Falei com ele sobre esta questão, quando tivemos a honra de o acolher no Suomen Pankki – Finlands Bank, por ocasião de uma conferência em que participou. Explicoume que, na primeira reunião do Conselho do BCE, chegou mesmo a recusar entrar na sala de reuniões até a palavra “Bundesbank” ter sido retirada do seu cartão de acreditação. Não há dúvida que levava muito a peito esta questão!

Tinha boas razões para tal e conseguiu fazer valer o seu ponto de vista: os governadores e os membros do Conselho de Supervisão devem vir às reuniões do Conselho do BCE e do Conselho de Supervisão para debater as decisões com imparcialidade e tomar as melhores decisões possíveis para o conjunto da área do euro. Todos deveríamos adotar a abordagem de Hans Tietmeyer nas nossas discussões em matéria de supervisão – é certamente esse o rumo no seio da supervisão bancária europeia.

Cooperação perfeita a todos os níveis da supervisão bancária europeia

Para concluir a minha análise em relação à subsidiariedade, gostaria de referir que espero que as minhas palavras contribuam para lançar alguma luz sobre a realidade do nosso trabalho diário na esfera da supervisão bancária europeia. Espero, em particular, ter demonstrado que a realidade não é tão simples como “as decisões a/b/c” são tomadas a nível central e as “decisões x/y/z” a nível local. Na prática, existe um maior espírito de cooperação e cada conjunto de decisões ganha com o contributo de ambos os níveis.

O nosso objetivo, à medida que a Supervisão Bancária do BCE amadurece, é que a tomada de decisões beneficie cada vez mais de um espírito de cooperação perfeita entre os níveis local e central. Esta é a única forma de maximizar o saber coletivo que podemos aplicar a decisões individuais e, assim, conseguir o tipo de subsidiariedade que melhor se adequa ao contexto da supervisão bancária.

Proporcionalidade

O segundo tema principal que gostaria de abordar é o princípio da proporcionalidade. Este princípio visa controlar o exercício de poderes pelas instituições da UE. A atuação destas instituições deve restringir-se ao que é necessário para alcançar os objetivos estabelecidos nos Tratados da UE.

No que respeita à supervisão bancária europeia, o nosso objetivo primordial é contribuir para a segurança e a solidez do sistema bancário e a estabilidade do sistema financeiro na área do euro. Adotar uma abordagem proporcional na prossecução deste objetivo significa dedicar especial atenção às instituições de crédito que acarretam maiores riscos para o sistema bancário e financeiro.

Gostaria de explicar de que forma as regras e o funcionamento atuais da supervisão bancária europeia atuam no sentido de apoiar o princípio da proporcionalidade. Em seguida, aludirei ao modo como podemos tomar medidas adicionais para incorporar ainda mais a proporcionalidade no nosso trabalho.

Regras e abordagens atuais reconhecem a importância da proporcionalidade

No que respeita ao conjunto de regras vigente, penso podermos afirmar claramente que já foram envidados esforços significativos para integrar a proporcionalidade no trabalho da supervisão bancária europeia. O texto do regulamento em matéria de requisitos de fundos próprios (RRFP) torna claro, designadamente no considerando 46, que os requisitos devem ser aplicados proporcionalmente à natureza, ao modelo de negócio e às atividades de cada instituição.

Em termos específicos, o RRFP estabelece que o processo de análise e avaliação para fins de supervisão (Supervisory Review and Evaluation Process – SREP), utilizado pelas autoridades de supervisão para definir requisitos adaptados às instituições de crédito, deve ser conduzido de forma proporcional. Tal significa que a frequência e a intensidade do SREP deve variar entre instituições de crédito em função da dimensão, complexidade e perfil de risco das mesmas. As decisões sobre a imposição de medidas de supervisão têm igualmente de ser tomadas de forma proporcional. Por outras palavras, importa prosseguir um fim legítimo e tal deve ser efetuado com razoabilidade – recorrendo apenas às medidas necessárias para alcançar o fim pretendido.

O dever de proporcionalidade no nosso trabalho está também explicitamente consagrado no Regulamento do Mecanismo Único de Supervisão. O artigo 1.º estabelece que a supervisão bancária europeia está obrigada, no desempenho das suas funções, a ter plenamente em conta os diferentes tipos, modelos de negócio e dimensões das instituições de crédito. Este patamar adicional de obrigações de proporcionalidade reforça o facto de os legisladores terem claramente pretendido assegurar que a supervisão bancária europeia funcione de forma proporcional.

Aplicação de abordagens proporcionais

Como podemos aplicar estes princípios louváveis à realidade do nosso trabalho quotidiano? Permitam-me que lhes dê alguns exemplos ilustrativos de que encaramos estes deveres com seriedade.

Neste domínio, devemos atuar de forma equilibrada, dado que temos o dever de realizar uma supervisão harmonizada e proporcional. Como sabem, a harmonização da metodologia de supervisão é importante para criar condições de igualdade na união bancária.

A fim de conciliar estes dois objetivos, começamos por definir um nível mínimo de atividade de supervisão, aplicável a todas as instituições de crédito. Tal permite-nos assegurar que todas obedecem às mesmas normas e que a intensidade da supervisão é, em todos em casos, suficiente para demonstrar o cumprimento dessas normas. O nosso “nível mínimo de envolvimento” é um elemento constitutivo essencial da nossa abordagem harmonizada em matéria de supervisão.

O próprio conceito de “nível mínimo de envolvimento” inclui uma componente de proporcionalidade, visto que não é igual para todas as instituições de crédito. As instituições de crédito de maior dimensão e que apresentam mais riscos começam automaticamente com um nível mínimo de envolvimento mais elevado, ao passo que o ponto de partida das instituições de crédito de menor dimensão ou que apresentam menos riscos é menos exigente em termos de supervisão.

A introdução de patamares adicionais de requisitos de supervisão para as instituições de crédito assegura, assim, maior proporcionalidade na intensidade da supervisão. Estes patamares variam em função da dimensão, da importância sistémica e do perfil de risco da instituição em causa. Logicamente, quando uma instituição é de grande dimensão, sistemicamente importante ou acarreta, de qualquer outro modo, riscos, é necessário investir mais tempo e energia para tentar gerir esses riscos.

Trata-se apenas de uma questão de bom senso, que se encontra também formalizada nos nossos sistemas através de um processo de planeamento estratégico e operacional. Em última análise, as nossas decisões sobre a intensidade da supervisão estão refletidas no plano anual de atividades de supervisão. Nele se definem, para cada instituição significativa, as atividades que a equipa conjunta de supervisão realizará anualmente – incluindo as decisões baseadas no risco sobre as inspeções no local e as análises de modelos internos que serão efetuadas.

A nossa abordagem proporcional à intensidade da supervisão abrange tudo o que fazemos. Define os nossos requisitos de prestação de informação e determina as taxas de supervisão que cobramos e, em última instância, as medidas de supervisão que adotamos para manter um grau elevado de cumprimento das regras.

Melhoria do princípio da proporcionalidade

À luz do exposto, poder-se-ia ficar com a impressão de que a supervisão bancária europeia já funciona perfeitamente e de que não é possível melhorar a proporcionalidade do nosso sistema de regulamentação e supervisão. Não é esse o caso – há sempre margem para melhorias e procuramos pensar nisso diariamente.

Reconheço que está a decorrer um debate sobre as reformas que se seguiram à crise financeira – nomeadamente sobre a possibilidade de estas terem tido um impacto desproporcionado nas instituições de crédito de menor dimensão. Neste debate, concordo com a análise que o Governador Yannis Stournaras apresentou numa conferência recente sobre esta matéria, realizada no banco central nacional da Grécia. No seu entender, há um maior foco nestas questões a nível europeu por três motivos compreensíveis:

  • Primeiro, a abordagem harmonizada ao máximo no âmbito do RRFP traduziu-se num nível muito mais elevado de convergência das normas regulamentares. Esta harmonização mais rigorosa é necessária para o desenvolvimento da união bancária, mas também elimina discricionariedades nacionais, que permitem não seguir certos elementos das regras.
  • Segundo, as reformas posteriores à crise expandiram-se, abrangendo novos aspetos da organização e das atividades de negócio das instituições de crédito. Um conjunto mais denso de requisitos regulamentares é agora aplicável a todas as instituições de crédito – incluindo em questões de liquidez e alavancagem.
  • Terceiro, a criação da união bancária elevou as responsabilidades de supervisão para a esfera europeia, o que retirou do foro nacional a responsabilidade pela tomada de decisões sobre o nível de intensidade da supervisão.

Na sequência destes desenvolvimentos, as regras e os organismos europeus passaram a ser mais importantes na determinação de abordagens proporcionais no âmbito da supervisão. Por conseguinte, é natural que exista uma maior discussão a nível europeu sobre como encontrar o equilíbrio certo entre proporcionalidade e harmonização.

Propostas específicas para uma maior proporcionalidade

Gostaria agora de mencionar algumas das ideias específicas que estão atualmente a ser discutidas no tocante a medidas adicionais para alargar a proporcionalidade à legislação em matéria de supervisão bancária europeia.

A este respeito, permitam-me afirmar que uma potencial simplificação da regulamentação deveria restringir-se principalmente aos requisitos de prestação de informação. Acredito firmemente que não podemos comprometer a segurança e que, portanto, não se justifica, em geral, reduzir ou eliminar os requisitos para determinados segmentos do mercado bancário.

Na minha perspetiva, quaisquer medidas no sentido de reduzir os requisitos de prestação de informação para garantir a proporcionalidade têm de restringir-se muito estritamente às instituições de crédito que apresentem, de forma inequívoca e comprovável, menor risco. Permitir alguma simplificação em circunstâncias tão estritamente limitadas proporciona uma recompensa concorrencial justificada às instituições de crédito que acarretam menos riscos para o sistema financeiro e, consequentemente, para a sociedade.

Abordarei agora a questão fulcral – como separar as instituições de crédito “seguras” das restantes no que toca a regras regulamentares? A minha resposta concisa é que temos de o fazer de forma muito cautelosa. Precisamos de assegurar que a elegibilidade para qualquer simplificação dos requisitos de prestação de informação se restringe a instituições de crédito que apresentem um risco genuinamente baixo. Caso contrário, distorceremos a concorrência de forma injustificada e, nesse processo, tornaremos o sistema menos seguro e sustentável.

No que respeita aos critérios específicos para determinar o estatuto de “baixo risco”, apoiaria o tipo de abordagem proposta por Thomas Hoenig, da Federal Deposit Insurance Corporation, designadamente critérios rigorosos e claros que captem uma imagem bastante sofisticada do perfil de risco das instituições de crédito. Por exemplo, os critérios poderiam incluir um rácio de alavancagem superior a 10%, um nível baixo de exposição a produtos derivados, sendo esta limitada a produtos simples, e a ausência de ativos e passivos para negociação.

Obviamente, os pormenores exatos destes critérios estão abertos a discussão. Contudo, no meu entender, o caminho certo é uma abordagem que limite a simplificação dos requisitos de prestação de informação de forma estrita, captando as múltiplas dimensões do risco. O risco bancário é um fenómeno complexo e, portanto, é necessário mais do que um simples critério baseado na dimensão para o entender.

Uma abordagem à proporcionalidade assente apenas num critério de dimensão não seria, a meu ver, uma abordagem baseada no risco. Uma tal abordagem não refletiria as lições da história. O passado mostrou-nos muitas vezes que é bastante possível que instituições de crédito de pequena dimensão provoquem perturbações graves na economia – basta relembrar a crise das sociedades de poupança e de empréstimos nos Estados Unidos e também a experiência nórdica.

Por conseguinte, não aconselho a adoção da proposta atualmente em discussão, que reduziria os requisitos de prestação de informação aplicáveis a instituições de crédito de menor dimensão de forma bastante direta. Pelo contrário, deveríamos adotar uma abordagem mais matizada, que assegure que os menores requisitos de prestação de informação sejam aplicados apenas às instituições de crédito com o menor grau de risco. Este tema merece maior reflexão – tanto no âmbito da conceção dos nossos processos atuais como no contexto do debate legislativo em curso.

Conclusão

Para concluir, partilhei hoje algumas das minhas ideias sobre a proporcionalidade – um princípio subjacente à supervisão bancária europeia há já algum tempo. A legislação e as práticas vigentes já estabelecem uma diferenciação entre instituições de crédito, centrando-se nos maiores riscos para a sociedade. No que respeita aos requisitos de prestação de informação, talvez haja margem para uma maior diferenciação no futuro. Se assim for, tal deverá ser efetuado de forma sofisticada – assegurando que só as instituições de crédito com o menor grau de risco beneficiam de requisitos de prestação de informação simplificados.

No que se refere aos processos de tomada de decisão, o nosso objetivo na conceção da supervisão bancária europeia foi evitar que o BCE se tornasse um “ditador” centralizado no seio do processo de decisão. Procurámos, ao invés, honrar o princípio da subsidiariedade no nosso sistema. Estamos gradualmente a incorporar uma abordagem de perfeita colaboração entre o BCE e as autoridades nacionais, que se estende a todas as nossas atividades. Acredito ser esta a abordagem certa para supervisionar um setor bancário que ascende a 27 biliões de euros.

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